Tuesday, August 08, 2006

Oblívio

Oblívio é uma palavra que significa esquecimento total, eterno. Acho-a linda. Há horas em que quero esquecer. Perguntaram-me, dia desses, do que tenho medo. Disse que da ignorância, em todas as suas formas, desde aquela causada pela ausência do bom-senso, como a que advém pela ausência de escolaridade, ou a do fanatismo mesmo.

Mas me preocupo em especial com a ignorância que advém do excesso de escolaridade (educação formal está longe de significar sabedoria), ou da autoconfiança em demasia.

Explico.

As pessoas acham que a primeira guerra moderna foi a do Iraque, em 1991. Verdade, do ponto de vista da tecnologia. Muita informação. Bombardeios ordenados on line e transmitidos ao vivo. Um bang bang em tempo real. Mas do ponto de vista da historiografia militar, entretanto, a primeira guerra moderna foi a do Vietnã. No Iraque os exércitos ainda lutavam com exércitos. Havia mapas, fronteiras definidas, alvos a serem atacados e destruídos. Na guerra moderna, por outro lado, isso tudo é luxo. Os generais não sabem o que atacar, o que destruir e conquistar, e, mais das vezes, lutam contra um inimigo invisível. Melhor dizendo: Todos podem ser o inimigo. Não há fronteira ou mapa que informe a situação. É como se tivessem aplicado a teoria do caos à ciência militar.

A primeira vez que se viu uma guerra assim foi no Vietnã. Um inimigo invisível, determinado, perigoso, que podia atacar de qualquer lado, que podia ser qualquer um.

Agora esse conflito no Líbano. Às vezes – sei que é maluquice - fico pensando no general judeu encarregado da invasão. Rezo por ele. É certamente muito competente, condecorado, capaz. E, como bom judeu, ardente na fé. Passou anos na academia militar. Mas pouco do que estudou pode ser aproveitado nesse novo mundo. Certamente, não sabe sequer por onde começar a desmontar o Hezbollah.

O que se aprende nos colégios militares? A tomar decisões. Para tanto, assim como os físicos estudam física, e os juristas a lei e a jurisprudência, os militares apreendem se as decisões tomadas nas batalhas do passado foram certas ou erradas. Noutras palavras, estudam as famosas escaramuças bélicas, manobras e táticas, que foram aplicadas, todas, contra inimigo visível, que queria defender seu território, ou ganhar o território do outro. Não sem razão, vencer, na guerra antiga, era manter ou obter território.

Sucede, entretanto, que na nova guerra não há território. Não há linha de frente ou campo de batalha. Não há, sequer, exército inimigo. Tudo o que os militares aprenderam é inútil. Obsoleto.

Não há nada nos livros que ensine a vencer essa nova guerra.
E é justamente por isso que ela não pode ser vencida.
Não, pelo menos, através da ciência militar.

Então, imaginando o comandante judeu, penso nele atacando uma cidade... Onde bombardear? Onde invadir? Onde ocupar e vistoriar? O que manter e proteger? Todos sabem que, logo que ele desocupar a cidade, o Hezbollah aparecerá novamente com mais foguetes, com novos mísseis.

Não é assim que se vence um inimigo oculto, um exército de anônimos.

Então, no que importa dizer, é a ignorância oriunda do excesso de instrução (ainda que obsoleta) e da auto-confiança que está provocando essa confusão toda. Claro que o governo libanês tem sua parcela de responsabilidade por nada ter feito contra a milícia terrorista que opera em seu território (O século XXI será o século das responsabilidades, assim como o XX foi o século dos direitos). Mas Israel tem mais culpa ainda por acreditar que isso tudo pode ser resolvido através da força bruta. Agora estão em um mato sem cachorro, exatamente como os norte-americanos quarenta anos atrás. É ridículo constatar a incapacidade humana de não repetir erros já cometidos na história.

A única coisa que Israel conseguirá com essa invasão é treinar uma nova geração de terroristas.

Por isso que essa guerra tem acabar, imediatamente, e cair no oblívio.

Justamente como esse desabafo.

3 Comments:

Blogger Luiz Roberto Lins Almeida said...

Oblívio. todas as guerras deveriam cair no esquecimento.
mas Israel realmente não tem solução, ou guerreia, ou guerreia.
eu preferiria que tudo acabasse em amor, embora isso pareça meio hippie...
Vai saber assim lá de guerra assim lá longe.

6:48 PM  
Blogger Luiz Eduardo Silva Parreira said...

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10:25 PM  
Blogger Luiz Eduardo Silva Parreira said...

A guerra, teoricamente, altera seus conceitos e qualifica suas fases, quando mudanças significativas ou marcantes demonstram que certas coisas não são mais como antes. Foi assim na Primeira Guerra mundial, mas não foi assim na Guerra do Vietnã, que utilizou fartamente de guerrilha, é verdade. Entretanto essa tática é utilizada há centenas de anos, tendo, por óbvio, evoluído segundo as necessidades de cada era. Na expulsão dos holandeses do Brasil, no século XVII, por exemplo, a guerrilha foi utilizada como forma de combate pelos brasileiros.

Dessa maneira, o Vietnã não pode ser considerado como o primeiro conflito moderno por conta desse tipo de emprego de combatentes. No Sudeste Asiático ainda se encontrou a clássica definição de guerra: Estados que se digladiam por conta de objetivos territoriais, tendo se iniciado com a invasão do Vietnã do Sul pelo do Norte. Os ‘Vietcongs’ – os guerrilheiros – eram sul-vietnamitas da Frente Nacional para a Libertação do Vietnã (FNL) que combatiam a coligação de forças incluindo os Estados Unidos da América, a República do Vietname (Vietame do Sul), a Austrália e a Coréia do Sul. No máximo, o Vietnã pode ser classificado como um conflito no qual se utilizou de certas táticas da Guerra Irregular Moderna (ou guerra de quarta geração/4GW). Aliás, a primeira 4GW ocorreu, por infeliz coincidência, na palestina dos anos de 1947 e 1948.

Já o atual conflito entre Israel e Hezbollah, em termos de teoria militar, os combates têm, sim, feito os tecnocratas militares se questionarem se ali não nasceu um novo tipo de guerra, uma evolução da sua quarta geração: a de uma organização (isto é, não é uma nação, um Estado ou um povo, mas sim, um grupo) que declara guerra a um Estado no seu sentido clássico, efetuando, entretanto, ataques por detrás de uma fronteira internacional (as guerrilhas rurais incentivada por Mao e combatida pelo Estado Brasileiro contra um grupo que adotou tal tática para a tentativa de implantação de uma ditadura comunista no Brasil, atacava pontos governistas, porém, de dentro do próprio território nacional. Ali já se tinha uma fração d4 4GW).

Certamente o Estado-Maior israelense deve ter – em certo grau – estudado como lidar com tal situação, pois a realidade daquele país exige isso dos seus chefes militares. Contudo, deve-se admitir que se prever um ataque do Hezbollah de fora de suas fronteiras, utilizando-se desde foguetes de 127mm até UAV’s; nesse grau, poucos poderiam supor, quiçá, nenhum.

Portanto, como coisa nova, as análises dos resultados obtidos por ambos os lados também não podem ser feitas com base no clássico conceito de ‘objetivo a se conquistar’, até porque, na 4GW é comum o emprego da tática “perder para vencer” (vide a resistência iraquiana, que perdeu a guerra convencional). 4GW se vence com inteligência (em todos os seus sentidos).

Em diversos artigos e livros já se demonstrava que um dos combatentes das 4GW não seria Estados e que a forma de como combatê-los será destruindo seus pontos de abastecimento, isto é, mais das vezes, áreas predominantemente civis. A diferença entre manter parte da área ou de devastá-la totalmente (pois não se sabe onde atirar), vai da vontade do comandante e dos políticos. Israel, após prévio aviso, optava pela segunda. E sem ilusão: qualquer comandante militar ou político, sob pressão, do mundo, assim agiria.

O mais assustador de tudo isso é que há quem acredite que a 4GW – por não envolver mais Estados, mas sim, organizações que não têm respeitado os acordos internacionais referentes a tratamento diferenciado entre quem é combatente e quem é civil, bem como do conceito de guerra – há muita chance de se pode regredir à guerra total, com o aceite de ataques a qualquer posição onde está ou possa estar o inimigo. E agora, tanto Israel quanto o Hezbollah, só nos mostraram que isso pode ser verdade ... infelizmente.

10:33 PM  

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